Quando um pequeno se mostra um gigante

Tempo de leitura: 6 minutos

Gráfico que mostra que a vida não é linear

Hoje meu dia estava planejado da seguinte forma: acordar por volta de 7:30h, terminar de assistir uma aula pela internet, me arrumar e ir à dentista marcada para as 10h, comprar os livros da Ciranda de Livros da escola dos meus filhos, pagar algumas contas, voltar pra casa, almoçar, colocar os pequenos pra escola, ir ao Correio, ir ao banco, resolver algumas questões do trabalho, voltar pra escrever o texto de hoje do Papo de Mãe e estudar enquanto não dá a hora das crianças voltarem da escola. Então, dar atenção a eles até a hora de dormirem, para assim que eles pegarem no sono retomar os estudos e dar uma checada nas redes sociais. Isso é aquele plano do nosso fantástico mundo ideal, ou seja, aquilo que pertence somente ao mundo das ideias.

Porque vou contar a vocês como realmente foi o meu dia: pra começar não acordei no horário planejado. Fui acordada por volta de 5:40h, com meu filho mais novo me chamando no quarto, na verdade chorando, sabe aquele choro de berro que nos arranca do nosso sono num susto que você já pula da cama com o coração disparado, então, bom dia, foi assim que amanheci! Acredito que algumas ou alguns que estiverem lendo esse texto já estejam se identificando com essa situação. Pois bem, fui ao quarto deitei ao lado dele, perguntei o que estava acontecendo e parecia que tinha tido um pesadelo e voltou a dormir. Então, adormeci ao lado dele, mas cerca de 10 minutos depois, o choro recomeça e nada de entender o que se passava…e volta a dormir. Na terceira vez, por volta de 6h ele começa a chorar mais forte e num sobressalto ele chama “aquele Raul” e coloca pra fora tudo o que eu nem imaginava que cabia dentro. O resto não preciso descrever…banho, carinho, colinho, limpa o quarto dele, limpa tudo, levo pra minha cama e caímos no sono novamente. Cerca de 30 minutos depois, por volta de 6:30h, o choro recomeça e já pego ele no colo pra levar pro banheiro, mas não dá tempo e ali mesmo do lado da cama a cena se repete…banho, carinho, colinho, limpa o meu quarto, limpa tudo, coloco um colchão na sala, ligo um desenho e caímos no sono novamente. E quando eu pensei que havia acabado, passados mais 30 minutos, por volta de 7h recomeça, levanto correndo, pego no colo e dessa vez quaaaaase chego no banheiro, mas foi ali na porta mesmo…banho, carinho, colinho, limpa o corredor do banheiro, limpa tudo, levo para a sala e caímos no sono. B om, acho que agora foi tudo, não tem mais nada.

Depois dessa maratona levanto da cama já tarde, acordo meu filho maior pra começar seu dia enquanto vou tomar meu café. E chega a hora de se arrumar, almoçar e ir pra escola. Teo exausto pela manhã conturbada acorda por volta de 12h, bebe uma água, com corpo molinho pede pra ver um desenho, coloco e por volta de 12:30h começa tudo de novo…coloca tudo o que já não tinha pra fora…banho, carinho, colinho, deita na cama do irmão e espera, porque agora eu teria que me arrumar, precisávamos ir pro hospital entender o que se passava.

E corre e desce marido com o Mateus pra ir pra escola e sobe e toma banho e se arruma e arruma o Teo…ih! Mateus esqueceu a lancheira…e pega carro e vai pro hospital…14h. Ele abatido, já um pouco desidratado, tentando se manter acordado no carro, um Uber, acorda já na porta do hospital e pergunta: “- Já chegamos rápido?”, respondo que sim e ele se vira para o motorista e diz: “- Obrigado moço!”. Ele tem quatro anos, estava passando mal desde às 5:40h da manhã, mas se mantinha acordado àquela altura, mas arrancou forças para ser grato ao motorista do Uber!!!! E tudo vai fazendo sentido: ter sido acordada e não acordado sozinha, não ter assistido àquela aula, ter faltado à consulta na dentista e não ter feito absolutamente nada do que estava planejado, porque passamos a tarde no hospital, chegamos em casa por volta de 18h horas debaixo de um temporal, com direito a granizo e tudo mais. E ele ali, firme e forte, medicação para conter as náuseas e vômitos, soro pra hidratar, glicose para repor o que havia perdido e agulhadas. E ele ali, sereno, fazendo a gente sentir o tempo, viver no tempo e estando presente. Porque não há situação que te faça estar mais presente do que um filho quando adoece. O tempo pára ali…nele! O tempo é contado pelas gotas que pingam do soro, pelos segundos que você está ali e a espera pra voltar pra casa.

Foto mostrando filho no colo da mãe após precedimento médico

E óbvio que nesse tempo as mensagens chegavam aos montes pelo celular tentando nos tirar do presente, mas hoje tudo isso pode esperar, na verdade deveria ser sempre assim, fazer o que é importante e não o que é urgente. E por que comecei esse papo falando de um pequeno e um gigante, porque confesso que tem horas que olho pra ele e sinto que a criança sou eu, que quem tem algo ou muito a aprender sou eu, porque em momentos como esse, ele e as crianças em geral, nos ensinam tanto! Ele tirou um tempo em meio à dorzinha dele pra agradecer ao cara do Uber por ter chegado rápido ao hospital! E nós, quantas vezes nós somos capazes de parar de olhar pra nossa dor e enxergar o outro ou em meio à nossa dor sermos gratos?

Ser responsável pela vidinha de alguém é uma missão incrível e a jornada da educação é muito mais sobre aprender do que sobre ensinar, é sobre manter-se com a escuta atenta e aberto ao diálogo. É um ato de mediação, de troca, de saberes e saber não tem idade!

Hoje o dia não foi nada daquilo que havia planejado, mas o aprendizado foi tanto! O tempo foi dilatado, sua qualidade intensificada e houve troca, escuta, saberes, afetos, aprendizagens.

Hoje nosso pequeno se mostrou um gigante e nossos gigantes apequenados por essa criança que a cada dia nos faz sermos gratos por tê-lo em nossas vidas e que nos dá a justa medida de cada coisa, principalmente da importância que damos a cada evento que cruza nossos caminhos.

Hoje o dia foi nada linear, como a vida também costuma ser, NADA LINEAR e por isso foi maravilhoso!

Mantenha a escuta aberta para a sua criança, a de fora e a de dentro!

P.S. E o nosso papo também entrou na dança desse dia e acabou chegando aqui um pouco mais tarde do que o planejado, mas está tudo bem, certo?

Leia também “Papo de Mãe: Agora vai!!!”

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